Vou, ou talvez não.

Vou fechar os olhos e sonhar que sou o vento, um raio de sol e tocar ao de leve cada criatura, cada pedra, cada nuvem, cada sombra que passar por mim.
Senti-las uma a uma, até entender que passarei uma vida até conseguir tocar em todas, e que será algo que farei, mesmo que não queira, ou esteja cansada demais para o fazer.

Vou fechar os olhos e  vou imaginar que está tudo bem em cada ser que se cruza por ai, e que cada sorriso é dado com prazer, e cada abraço é real e sentido.
Que cada minuto mal vivido, é recuado no espaço por artes mágicas, em que sentimos desaparecer o Mundo até os nossos olhos se fixarem no que aconteceu de errado, com o pensamento angustiante de como é que eu faço? E é sempre seguido, obrigatóriamente por aquela sensação de que afinal não era nada.   

Vou fechar os olhos e respirar fundo e sonhar que todos os males cabem na minha mão, fechá-la com tanta força, até cerrar as minhas próprias unhas na minha própria carne até fazer sangue, enquanto o meu coração sorri levemente, e o meu cérebro inventa uma forma de encerrar definitivamente esse mesmo mal, talvez na lâmpada do génio,que enterrarei naquele Jardim Maldito, que ninguém procura para passear. E que ervas daninhas a escondam tão profundamente que as raizes das àrvores centenárias não as consigam alcançar.

Vou fechar os olhos e projectar-me noutra realidade, noutra dimensão, e correr tão velozmente de encontro ao que  desejo, que serei obrigada a fugir do que não desejo.
Que a velocidade da luz  me dê boleia, até encontrar um planeta que esteja fora do alcançe dos buracos negros.

Vou fechar os olhos e apanhar todos os malmequeres do Mundo, até não haver um espaço nos meus braços, e em todos os braços.
Em que tenhamos todos de baixar levemente a cabeça para nos cumprimentar-nos, num gesto digno e humilde, de quem diz estou aqui, por nós todos.   

Vou fechar os olhos e gritar tão alto, que ninguém ouvirá mais nada, até as ondas dos Oceanos, pararem de bater nas areias e rochas, suspensas no ar, e o meu grito se desfiar num leve gemido, que eu mesma não consiga ouvir.

Vou fechar os olhos e observar todas os rostos, até encontrar o mais doce de entre eles, que consiga me dar a doce ilusão que a vida é realmente bela e todas as lutas têm um real sentido e uma real lição para um futuro melhor.
E que quando esse futuro chegar, eu ainda tenha forças para aplicar as lições aprendidas, sem que permaneçam apenas na gaveta das memórias esquecidas, das experiências adquiridas, mas que ninguém quer ouvir ou realmente saber, ficando lições essas, gravadas na minha carne que desaparecerá mais depressa do que o tempo que precisei para tirar um real sentido da aprendizagem.

Vou fechar os olhos e sonhar que que na prática os bons são recompensados, e os maus castigados, e que a nossa história terá um final parecido com aquele filme, que já vimos centenas de vezes, porque é assim que
imaginamos um desfecho para nós mesmos. E o genérico faz com que as letras dançem ao som daquela música que nos toca bem cá dentro.

Vou fechar os olhos e imaginar que todas as crianças sorriem como gostamos de as ouvir, e que os seus choros sejam apenas de pequenas quedas, joelhos  roçados. E sonhar que todas as mães sabem exactamente o que fazer, em qualquer tipo de situação, com toda a ternura e calma do mundo, como as gravuras gostam de as representar, e que consigam fazer com que os seus petizes cresçam, sem que digam uma única vez, que a culpa de coisas mais disparatadas, seja da mãe.

Vou fechar os olhos....vou.... somente fechá-los.

Texto de Isabel Peres                                                                     

1 comentário:

  1. Sonha, sonha sempre. Sonhar ajuda a vida a ser mais doce ;)

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